Uma operação coordenada pela Polícia Civil do Rio de Janeiro mobilizou forças policiais de diversos estados para combater uma das maiores organizações criminosas do país voltadas à prática de crimes cibernéticos contra crianças e adolescentes.
A ação, batizada de Operação Adolescência Segura, ocorreu simultaneamente no Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Goiás e Rio Grande do Sul.
Entre os alvos da operação estava uma adolescente de 14 anos, de Cruz Machado, e outra de General Carneiro por meio da 4ª Subdivisão Policial de União da Vitória.
A jovem foi internada após mandado judicial de busca e apreensão por suspeita de envolvimento em crimes cibernéticos graves, como apologia ao nazismo, incentivo ao suicídio e automutilação, divulgação de pornografia infantil, maus-tratos a animais e tentativa de homicídio.
A quadrilha operava principalmente através da plataforma Discord, reunindo milhares de jovens em servidores onde crimes eram transmitidos ao vivo e, em alguns casos, monetizados.
A relevância e periculosidade da organização chamou a atenção de agências norte-americanas como a HSI (Homeland Security Investigations) e o NCMEC (Centro Nacional para Crianças Desaparecidas e Exploradas), que auxiliaram nas investigações.
Entrevista exclusiva ao Profissão Repórter
O caso ganhou repercussão nacional após a equipe do programa Profissão Repórter, da TV Globo, entrevistar uma adolescente envolvida no caso com autorização da Justiça e da família. Na reportagem exibida esta semana, a jovem revelou detalhes alarmantes sobre o funcionamento do grupo e seu papel dentro da organização.
“Eu era namorada do que tacou fogo no mendigo”, contou a adolescente, referindo-se ao ataque brutal ocorrido em fevereiro deste ano, no Rio de Janeiro, quando um homem em situação de rua teve 70% do corpo queimado por um adolescente enquanto o crime era transmitido ao vivo.
Segundo a jovem, ela atuava como “gerente de dados” do grupo, que reunia mais de 3 mil membros.
“Tinha os eventos pagos. As pessoas pagavam para assistir. Quando o evento era pago, a gente ficava com parte do lucro ou com cartões que a gente roubava”, disse.
A adolescente relatou ainda que participou de cerca de 300 eventos ao vivo, muitos deles envolvendo automutilação de meninas adolescentes, os quais ela mesma gravava e enviava ao líder do grupo, identificado como um homem de 25 anos, chamado Andrei.
Além das transmissões, ela afirmou ter participado de ameaças e extorsões contra vítimas. “Pegava os dados da mãe, mandava para elas e dizia que tinham 10 minutos para decidir o que queriam, senão a gente acabava com a vida delas.”
“Se meus pais tivessem me controlado, teria sido diferente”
Durante a entrevista, a adolescente também refletiu sobre a ausência de controle parental em sua vida digital. “Meus pais nunca tentaram impedir o que eu via. Se tivessem feito isso, teria me impedido de entrar no Discord. E eu seria muito grata hoje em dia.”
Ela também revelou ter se automutilado em 2022, durante um período de conflitos familiares e dificuldades na escola.
Investigação continua
A Polícia Civil do Paraná segue com as investigações para identificar outros integrantes da organização criminosa que possam estar atuando na região de União da Vitória e municípios vizinhos.
A Operação Adolescência Segura acende um alerta sobre os riscos da exposição de crianças e adolescentes a ambientes virtuais não monitorados, evidenciando a urgência de políticas públicas e envolvimento familiar no uso seguro da internet.

DISCORD
O Discord é uma plataforma de comunicação online que permite que pessoas conversem por texto, voz e vídeo, individualmente ou em grupos. Originalmente criado para comunidades de gamers, o Discord cresceu e hoje é usado por uma variedade de públicos — desde estudantes e profissionais até criadores de conteúdo e fãs de diversos temas.
Principais características do Discord:
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Servidores: São espaços privados ou públicos onde as pessoas se reúnem em torno de um tema (como um fórum moderno). Cada servidor pode ter vários canais de texto e voz.
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Canais de texto: Usados para bate-papo por escrito, envio de arquivos, links, memes, etc.
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Canais de voz: Para conversas em tempo real por áudio (como chamadas em grupo).
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Bots e automações: Usuários podem adicionar bots que moderam conversas, tocam músicas, organizam eventos, entre outras funções.
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Privacidade e anonimato: Usuários podem adotar apelidos e conversar com desconhecidos, o que torna a plataforma um ambiente de risco quando mal utilizado, especialmente por menores de idade.
Por que o Discord é frequentemente mencionado em casos de crimes cibernéticos?
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Por ser gratuito, ível e difícil de moderar completamente, o Discord pode ser usado por grupos que praticam atividades ilegais ou perigosas, como aliciamento, divulgação de conteúdo proibido e incitação à violência.
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O anonimato e a linguagem de comunidade fechada favorecem a manipulação emocional, especialmente de crianças e adolescentes que estão mais vulneráveis.

Adolescente de Cruz Machado é detida por ligação com organização criminosa